Friday, December 14, 2012

Acondroplasia e os novos potenciais tratamentos clínicos: quem pode se beneficiar deles?

Introdução 

Alguns dos 17 leitores deste blog têm perguntado sobre quem se beneficiaria com o tratamento potencial com o análogo do CNP e as outras abordagens diversas que temos analisado aqui. Esta é uma questão importante e preocupa e acho que vale a pena discutir um pouco este tema. 

O software do crescimento é complexo 

O crescimento inicia-se com as primeiras divisões celulares do ovo fertilizado e vai durar até ao fim da puberdade, o que significa, normalmente, menos de 20 anos. Assim, o crescimento é um evento temporário na vida de qualquer pessoa. 

O ritmo de crescimento e a altura final são quase totalmente determinados desde o início pelo código genético do indivíduo, com alguma interferência do ambiente. Quando todas as partes estão trabalhando em harmonia, o resultado do software, o programa genético, será entregue com mínima variação. Esse programa é definido por um número impressionante e crescente de genes e seus respectivos produtos (principalmente proteínas e peptídeos), com intensidade e tempo muito bem controlados (1-4). Qualquer perturbação no programa durante o período de crescimento, no entanto, pode causar atraso ou aceleração no crescimento. Por exemplo, dieta pobre em proteínas pode levar à baixa estatura adulta final. Hiperparatiroidismo, o qual é causado por excesso de paratormônio, pelo contrário, pode levar a um crescimento excessivo. 

A origem genética da acondroplasia 

A acondroplasia é causada por uma mutação no gene do receptor  de fator de crescimento de fibroblastos tipo 3 (FGFR3). Devido a essa mutação, a proteína FGFR3, que é construída com base na informação presente no gene FGFR3, torna-se mais ativa e leva a um desequilíbrio na regulação da velocidade de crescimento do osso (como mencionado acima). Como o FGFR3 é um redutor de velocidade e está trabalhando mais do que o esperado, os ossos no indivíduo afetado e, especialmente os ossos longos, vão crescer menos do que o que foi programado para esse indivíduo. O resultado desse desequilíbrio é bem conhecido: membros curtos, canal vertebral estreito, hipoplasia do terço médio da face, pernas arqueadas etc. Isso parece uma simples descrição de uma variação típica da diversidade do corpo humano, mas as consequências para o indivíduo afetado não são. Há muitas revisões disponíveis que descrevem as tão comuns complicações médicas associadas com a inibição do crescimento ósseo na acondroplasia. Para saber mais sobre elas, sugiro que você visite o artigo de orientação publicado pela Academia Americana de Pediatria aqui (em Inglês) ou aqui (em espanhol). (5) 

Ossos em crescimento e o FGFR3 

Todos os FGFRs são fundamentais para o desenvolvimento inicial do corpo até que este esteja bem formado. Em seguida, essas proteínas, as quais foram produzidas por todas as primeiras gerações de células, passarão a ser produzidas por um número limitado de tecidos ou órgãos. No caso do FGFR3, a maioria das células no corpo irá parar de produzi-lo (ou, pelo menos, em uma quantidade significativa). Podemos dizer que a principal exceção relevante são os condrócitos presentes em pequenas estruturas nas extremidades dos ossos, as quais chamamos de placas de crescimento cartilaginosas. As placas de crescimento são as estruturas responsáveis ​​pelo crescimento ósseo. É importante compreender que o FGFR3 vai ter um papel no controle da velocidade de crescimento enquanto houver uma placa de crescimento ativa. Portanto, quando a placa de crescimento fechar após o surto final de crescimento da puberdade, o papel de controle do crescimento do FGFR3 também irá cessar. Em outras palavras, quando a placa de crescimento da cartilagem desaparece, a sinalização (atividade) do FGFR3 no crescimento perde a sua relevância. 

Direto ao ponto 

A grande questão é: 

Quem poderia se beneficiar com as novas potenciais terapias medicamentosas para a acondroplasia? Pode um adulto ser tratado com uma desas drogas potenciais? 

As pessoas estão animadas com as notícias sobre o análogo do peptídeo natriurético tipo C (CNP) chamado BMN-111, que está sendo testado para ver se poderia resgatar o crescimento ósseo na acondroplasia. 

Você deve se lembrar que o CNP é também um dos muitos controladores do crescimento ósseo que mencionamos acima. Ele funciona através da redução da atividade de uma das reações químicas em cascata  acionadas pelo FGFR3 na placa de crescimento, por isso tem um papel positivo no crescimento ósseo. Você pode aprender mais sobre o CNP visitando este artigo do blog. 

No entanto, da mesma maneira que o FGFR3 é relevante para o crescimento do osso enquanto há uma placa de crescimento, apenas os indivíduos que têm ainda uma placa de crescimento aberta, com condrócitos vivos, seriam capazes de se beneficiar com o uso deste tipo de tratamento. Em outras palavras, apenas as crianças e adolescentes poderão se beneficiar com este tipo de terapia. Isto significa que, infelizmente, um adulto não poderá se beneficiar com a utilização, por exemplo, do análogo do CNP agora em desenvolvimento ou de qualquer outro composto anti-FGFR3, somente pelo fato de que ele não tem mais placas de crescimento.

Consequências


Isso também explica por que qualquer novo tratamento potencial para a acondroplasia terá de ser testado principalmente em crianças para ver se realmente funciona. Neste caso, os ensaios em adultos serão importante basicamente para aprender
principalmente sobre as questões de segurança de curto prazo e sobre como seria o seu caminho no corpo. 


Uma palavra sobre estudos clínicos em crianças 

Parece que no futuro próximo as crianças afetadas pela mutação do FGFR3 poderão ter acesso a uma ou mais opções de tratamento para resgatar o crescimento dos ossos e prevenir as complicações médicas comuns da acondroplasia. No entanto, antes que estes medicamentos em potencial possam chegar à farmácia, eles terão de ser testados para ver se são seguros e eficientes. Há muita preocupação sobre colocar nossos amados filhos em risco, expondo-os a ainda não tão bem conhecidas drogas experimentais. No entanto, é agora uma requisição das principais agências regulatórias em todo o mundo, tais como o FDA e a EMA, que um medicamento que será administrado a crianças deve ser testado primeiro em crianças. Além disso, atualmente, os ensaios clínicos são duramente regulados e existe forte vigilância por parte de governos, da mídia e dos cidadãos sobre como qualquer estudo clínico é realizado, não importa se em adultos ou crianças.

Para saber mais sobre o desenvolvimento clínico de potenciais medicamentos você pode visitar este artigo anterior, ou pode ir ao site do FDA aqui (em inglês). Você também pode visitar esta página (em inglês) do FDA para saber mais sobre proteção adicional para crianças em ensaios clínicos. 

Referências

1. Wuelling M and Vortkamp A. Chondrocyte proliferation and differentiation. In Cartilage and Bone Development and Its Disorders. Camacho-Hübner C, Nilsson O, Sävendahl L eds. Karger, Basel. Endocr Dev 2011; 21: 1–11.
2. Mackie EJ et al. The skeleton: a multi-functional complex organ. The growth plate chondrocyte and endochondral ossification. J Endocrinol 2011; 211: 109–21. (acesso livre)
3. Lui JC et al. Synthesizing genome-wide association studies and expression microarray reveals novel genes that act in the human growth plate to modulate height. Human Mol Gen 2012; 21 (23): 5193–201. doi:10.1093/hmg/dds347.
4. Takarada T et al. Clock genes influence gene expression in growth plate and endochondral ossification in mice. J Biol Chem 2012; 287 (43): 36081–95. doi: 10.1074/jbc.M112.408963.
5. Trotter et al. Health supervision for children with achondroplasia. Pediatrics 2005; 116(3): 771-83. (acesso livre)

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